A REVOLTA DA PLEBE
O MEDALHÃO DE LIVIA

494 a. C.
Livia Tullia e Titus Marcius eram dois jovens plebeus que viviam na Roma Antiga. Livia pertencia a um grande e tradicional clã de artesãos de vasos e cerâmicas. Já o grupo descendente de Titus era repleto de pequenos comerciantes de tecidos. Os dois viviam em casas próximas. Livia era mais velha. Titus era mais alto. Tinham uma certa amizade que se revelava nas parcas brincadeiras que faziam nos momentos livres que tinham. Na maioria das vezes, entretanto, ajudavam nos afazeres cotidianos.
Para além das diferenças, um detalhe misterioso os aproximava: cada um deles tinha seu amuleto mágico. Livia tinha um tipo de medalhão (bulla) de proteção contra o mal que estava sempre enroscado em seus cabelos amarelos ou escondido em seu pescoço de pele clarinha. Já Titus carregava consigo, preso em seu forte punho de pele morena, um objeto de bronze em forma de fígado de carneiro com escritos etruscos, que servia para adivinhar o futuro (haruspicia). Naqueles últimos dias, os dois amuletos estavam avisando reiteradamente sobre “desespero e morte”.
Era o ano de 494 a.C. Em um entardecer, Livia e Titus resolveram se aventurar. O medalhão de Livia estava luzindo incandescente e ela acreditava ser isso um sinal. O fígado de bronze de Titus balançava sem parar, outro sinal grave. Mesmo assim, impulsionados pela excitação e pelo agito dos últimos dias, eles foram correndo em direção ao Monte Sagrado. No caminho, escondidos perto de uma pilastra, observaram, assustados, vários homens (magistrados patrícios) muito bem-vestidos, e junto deles os dois cônsules Vergínio e Vetúrio. Mesmo sob uma revolta de plebeus, os líderes políticos estavam na rua dando ordens às legiões para saírem da cidade e enfrentarem os inimigos estrangeiros volscos e équos.
Era um momento de tensões sociais. Livia e Titus saíram escondidos da pilastra e continuaram sua jornada. Os dois chegaram perto da base do monte já à noite. Lá viram os plebeus, aqueles homens e mulheres comuns, trabalhadores, com suas espadas, lanças, fações e tochas. O rapaz, cansado, deitou-se no chão. Livia, afoita e ansiosa, queria continuar. Eles discutiram rapidamente. A menina, inconformada, continuou subindo sozinha.
Os gritos e palavras de ordem da multidão polvorenta ecoavam diante da fina pleura ventosa de uma noite assombrada por lua azulada.
Livia, curiosa, chegou bem perto da beirada da montanha. Pupilas aguçadas. Ela queria ver mais de perto os acontecimentos. Seu medalhão brilhava e mostrava um semblante assustado. Livia parou perto de uma grande fenda no chão. Ouviu chamarem seu nome e depois viu um vulto. Dedos joviais agarraram o medalhão brilhante, que arrebentou do pescoço da menina. Ela gritou! O som reverberou e se misturou às vozes dos revoltosos que, perto dali, discutiam e oravam. Ninguém percebeu ou ouviu nada.
Os plebeus continuaram a pedir por direitos que nunca tiveram e nem sabiam se iriam conseguir. A noite foi longa.
No dia seguinte, a discussão na casa de Titus era não apenas sobre a revolta, mas, principalmente, sobre o desaparecimento de Livia. Questionado, o menino disse que ficou muito cansado naquela noite e que dormiu no chão esperando a amiga voltar do monte. Dizem que os pais de Livia, por serem clientes de alguns patrícios ricos e importantes, conseguiram acesso aos presságios dos sacerdotes (áugures) e à rara leitura dos Livros Sibilinos dos oráculos. Nada disso, entretanto, levou-os a saber do paradeiro da menina. Enquanto a revolta da plebe continuava, houve procura e busca pela jovem em todos os cantos do monte e em diversos locais da cidade, mas nada. Não encontraram nenhum vestígio. Depois, já conformados, os pais fizeram um grande ritual simbólico cheio de oferendas e homenagens a Livia.
Nesse período, Titus ficou bastante calado e apreensivo. Depois, continuou sua vida normalmente. Entretanto, vez ou outra, o menino ia até a pequena horta atrás da casa de seus pais e desenterrava o medalhão de Livia, via-o brilhar, apertava-o no peito, chorava e enterrava-o de novo.
Mas Titus não fez isso por muito tempo. Isso porque ele morreu na crise de fome que atingiu a região nos anos vindouros. Assim, o medalhão de Livia ainda está enterrado lá, esquecido, e até hoje guarda consigo a real face do assassino da menina.
TEMPO HISTÓRICO: IDADE ANTIGA
ESPAÇO GEOGRÁFICO: ROMA
DATA DE PUBLICAÇÃO: 28/09/2025
AUTOR: FABIO GOHMEIZ
REVISÃO: CIAENTRELINHAS
ILUSTRAÇÃO: WIX / COPILOT
